O
esplendor do Bumba-meu-boi de Morros veio a tona na história do
folclore maranhense e do Brasil no dia 23 de junho de 1976, há 31
anos passados, fruto de um trabalho educativo das professoras da
Escola Normal Monsenhor Bacellar para recuperar uma tradição do
início do século que estava esquecida na região do Munim. A
diretora Terezinha Bacelar e os professores e amigos: Maria
Marlene Ferreira Lobato (principal idealizadora), Maria Aparecida
Ferreira Lobato, Maria do Socorro Araújo Ferreira, José Ribamar
Muniz Lobato e Valter Ferreira.
Entre intempéries, contradições, lutas, convencimentos e
trabalhos causados pelos impactos da nova idéia que visava reunir
estudantes jovens de ambos os sexos em seus cordões, não era de se
esperar facilidades, ocasionados de outros lados pelos
preconceitos e tradições enraizadas na cultura popular de que o
Bumba-meu-boi era somente para adultos, caboclos e homens,
acostumados às maratonas cansativas, entre bebedeiras, viagens,
noites de sono e desconfortos da referida brincadeira.
A resistência foi grande, as preocupações com as rotinas
preconcebidas exigiam muitos cuidados e responsabilidades, que por
conta de projeto que incluía todas essas possibilidades, enfim
vencem, adquirindo seu devido consentimento e vitorioso se fez
realizar até hoje.
Naquela década, não sonharam com certeza, nem os organizadores,
nem os brincantes e tampouco a comunidade de Morros, que o Boi de
Morros se tornaria, no futuro, uma das grandes expressões do
folclore brasileiro.
O Boi de Baiacuí, um povoado do município de Icatú, serviu como
fonte de inspiração para a inclusão de mulheres no cordão no mesmo
grau de igualdade dos homens. Mas, foi um boi emprestado de Boa
Vista, povoado de Juscelino, quem primeiro representou
simbolicamente o grupo que se iniciava com as índias: Conceição
Lobato, Conceição Araújo Ferreira, Maírla Aparecida Ferreira,
Maria do Rosário Araújo Ferreira e Aída Costa Feques, dentre
outras. O grupo foi completado com os vaqueiros de fita José
Ribamar Vieira, Clóvis José Bacelar, Carlos Alfredo Bacelar
Araújo, José Maria Muniz Lobato, Celeste Rocha, José Erasmo Silva,
Ercias, Antonio José e Leocândida, Alfredo Ferreira, Rui Barroso,
Artur Barroso, Lúcia Malheiros e Jesus Malheiros - acompanhados
pelos músicos Ângelo Afonso dos Santos, Joaquim (Cara de
Castanha), João Abajour e Luciano.
Calças de farda, chapéus emprestados, camisas por fazer e cachaça
com limão para os ensaios. Esse era o quadro do primeiro ano da
brincadeira que, logo no ano seguinte, contratou Zefinha Azevedo,
Filogônio e, mais tarde, Orlando Vieira para emprestar seu
encantamento ao brilho do grupo.
Recebendo o nome de Alegria dos Estudantes, o
Bumba-meu-boi de Morros, no primeiro ano de sua criação, trazia
no “couro” brilhantemente bordado, e um lado a Escola Normal e do
outro, a figura do Pároco Monsenhor Bacelar. Suas principais
toadas foram: “Levantei a Bandeira” e “Homem Trabalhador”, esta
última em homenagem ao referido Monsenhor.
O sucesso do Bumba-meu-boi da Escola Normal de Morros durou três
anos, que contou da data de sua fundação em 1976 até 1979. A
desistência da Escola deu-se por conta da mudança de residência da
Professora Maria Marlene Ferreira Lobato de Morros pra São Luís,
como também pelas dificuldades inerentes ao tipo de trabalho,
acompanhado pela falta de recursos financeiros pela existência de
razoável quantia de investimentos. A professora preocupada com o
fim da brincadeira procurou ajuda de José Hugo Lobato, que
acreditando na idéia passou a ser o principal patrocinador e
proprietário.
Como foi dito, em 1979, três anos depois, José Hugo Lobato
conhecido como Zuza em toda região do Munim, homem culto,
divertido e de retomada iniciativa, conhecido pelo seu trabalho,
organizador de diversos tipos de festejos, amante do Bumba-meu-boi
de orquestra, juntamente com sua esposa Maria Izabel Muniz
Lobato, incansável e acima de tudo amorosa, sempre preocupada com a
comunidade e principalmente com os mais necessitados, fizeram
ressurgir o Bumba-meu-boi de Morros, no Bairro Butiquim, como diz a
toada:
“...ele nasceu na Escola Normal e foi criado no Bairro do Butiquim...”
O Boi de Morros no seu primeiro ano com Zuza Lobato, recebeu o nome de “Sonho Realizado”
por conta de uma antiga paixão. Trazia em seu couro
brilhantemente bordado por Zefinha Azevedo, mulher na época
considerada de alta qualidade artística, de um lado a Cachoeira do
Tanque do Cristo Redentor e do ouro o lema da Campanha da
Fraternidade como bem poetiza a toada feita pelo seu filho:
“O
meu canário cantou e no seu canto dizia, Ave, Ave Maria, que
bonito ele está. De um lado ele trás um pequeno terror, que até
vida humana já tirou, e foi erguido em homenagem a sua vida o
Cristo Redentor.
Do outro lado um apelo a humanidade, educai as crianças na
fraternidade. Foi Deus quem mandou, São João permitiu, esse é um
“Sonho Realizado” que Morros já viu...”
Durante mais de três anos, sucessivos nomes recebeu o Boi de Morros. O segundo foi Dominador,
também sob o comando de Zuza Lobato que arduamente, com ajuda de
familiares e amigos morruenses, manteve a brincadeira até o ano
de seu falecimento em 1981.
Em 1982, o Boi de Morros não se apresentou, pois a família
guardava luto recente da morte do seu organizador. Em 1983 sua
representação aconteceu, desta vez feita sob a direção de seu
filho José Carlos Muniz Lobato e sua mãe Maria Izabel Muniz
Lobato, que testemunhando os últimos momentos de vida do seu pai e
marido respectivamente, haviam prometido, por conta de seu pedido
“não deixem a brincadeira acabar”, continuar a organização do
Bumba-meu-boi, promessa que vem sendo cumprida até hoje.
Maria Izabel Muniz Lobato (conhecida como Dona Izabel), nas
tentativas de retomar a brincadeira, tentou encontrar alguém capaz
de comandar a manifestação com o mesmo entusiasmo. Os cantadores
da época sempre despachavam em cima da hora prejudicando o grupo.
Com isso o seu filho José Carlos Muniz Lobato (conhecido como
Lobato), decidiu levar o boi em frente. Ele viabilizou a gravação
do primeiro vinil da brincadeira, trabalho inspirado na Campanha
das Diretas, na qual todo Brasil se mobilizou em nome do direito
de escolhas dos representantes políticos pelo próprio povo. Nesse
ano o boi foi apelidado de Boi das Diretas. Isso foi o divisor de
águas da trajetória do Boi de Morros comenta Lobato, que três anos
antes já havia composto a sua própria toada, intitulada “Ave
Maria”.
Amo de um dos mais bonitos bois do sotaque de orquestra do
estado, Lobato, revelou que antes de tomar a frente do boi, não
tinha qualquer identificação com a brincadeira:
“Não
gostava de bumba-meu-boi e costumava repreender meu pai pelo fato
dele se dedicar tanto aos ensaios e apresentações, pondo em risco
a própria saúde...”
Conhecedor de música, poeta e talentoso no violão, além de dotes
de liderança e com extrema preocupação com a cidade, Lobato vem
revolucionando o folclore maranhense, mais precisamente com o
Bumba-meu-boi, emancipando estilo, introduzindo cores,
interpretando contextos políticos, sociais e ecológicos. Essa
permanente dinâmica, sem alterar a essência do auto do boi, ponto
marcante e histórico dessa atividade cultural, tem permanentemente
estimulado o surgimento de muitos bois de orquestra.
No ano 1997, Lobato completou 15 anos à frente do Boi de Morros.
Na oportunidade foram lançados dois CD’S comemorativos, sendo um a
nível estadual e outro a nível nacional com muito sucesso.
Lobato também conta com apoio de muitos amigos e familiares, o
seu irmão, companheiro e amo José Maria Muniz Lobato que o ajuda
incansavelmente, sua irmã Maria Aparecida Lobato Reis que já
compôs varias toadas, sua esposa Maria da Conceição Ferreira
Lobato, que se dedica dia e noite, e seus filhos, Clarissa
Ferreira Lobato, José Carlos Muniz Lobato Filho, Saul Ferreira
Lobato, Talyta Ferreira Lobato, Emanuelle Ferreira Lobato e Mateus
Evangelista Ferreira Lobato, que o auxiliam nos preparativos das
temporadas juninas e integram a brincadeira como vaqueiros, índias
e intérpretes, como é o caso de Lobato Filho.
O Bumba-meu-boi de Morros foi conquistando espaço na cultura
maranhense, tornando-se um dos mais importantes e respeitados
grupos sotaque de orquestra do Estado do Maranhão.
Uma particularidade do boi, é que ele surgiu de um sonho de todo o
povo morruense, e principalmente de José Hugo Lobato (Zuza), que
hoje já não está no meio de nós, mas sua realização continua viva.
Ao todo são 160 componentes que através de suas indumentárias e
embalados pelo som de suas toadas, estão difundindo a paz por todo
o canto da terra.
Texto: ESTER MARQUES.
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